A ideia me veio tão rápida quanto o brilho da luz de um relâmpago no céu escuro. E me atingiu tão forte de um jeito que eu não sei se explico bem, mas foi como cair do prédio mais alto no asfalto mais rígido. E sem perceber me vi com um sorriso no rosto e não mais que uma réstia de melancolia no coração. De toda a minha dor restava não mais que um leve incomodo que eu facilmente afastaria com um espanar de mãos. Assim como se faz como as moscas no verão. Toda a minha tristeza foi embora sem mais nem menos, sem aviso prévio, sem nem um bilhete sobre o travesseiro. Por tanto tempo ela fora minha única companhia nas noites de insônia. Só ela secou minhas lágrimas, como mais ninguém faria. Era tudo o que eu conhecia. Tudo o que eu entendia. Agora ela se foi. E me abandonou aqui, com essa ilusão efêmera que alguns chamam por felicidade. Logo eu, que a recebi tão bem e de braços abertos. Eu me perdi por tanto tempo que esqueci como as coisas eram antes. Pode alguém se acomodar ao mais profundo desespero? É tão difícil ter que me reestruturar nessa nova realidade, que de tão profunda lembra um pingo d’água. Eu preferiria ver o mundo eterna e poeticamente em preto e branco. Queria voltar a me sentir tão frágil a ponto de perceber até a mais leve brisa como uma ameaça. Quero de volta a dor que me fez gritar poesias, tropeçar na arte, chorar saudade. A arte não pode nascer da felicidade. Não há nada lírico que se possa tirar daí. Como um parente que vem de longe, a tristeza voltou para o lugar de onde veio sem dar a data de sua volta. E cruelmente deixou marcas de sua presença em todos os cantos da casa. Levou consigo todo o silêncio angustiante, todas as horas intermináveis e deixou essa canção estranha que se repete no rádio. Vai ver até que essa vida é morte – uma moça canta – E a morte é a vida que se quer. Vai ver até...
Vai terminar seu refém
E a vida pára também.”